Thursday, August 08, 2013

Ela e o limbo

Ela está no vazio. Nada se clarifica, por mais que pense nisso. Por mais que corra, que ponha música, que fume cigarros. Nada a ajuda a perceber o que fazer. Como se a cada instante ela esperasse um sinal. Que o destino resolvesse por ela coisas que ela não sabe resolver. Que lhe arrancasse do peito aquele aperto, aquela dor de quem não sabe.

Mas o destino, se envia sinais, ela não os percebe e assim continua no vácuo. A cabeça conjetura todos os finais possíveis. Nenhum parece melhor que outro, são todos estanques e ao mesmo tempo confundem-se, misturam-se.

E ela já não sabe. Se ama mais o que tem, se sonha com o que não tem por amá-lo. Ou se no fundo o ama por não o ter.

Este limbo provavelmente não terá fim. Apenas a realidade esbaterá o que exalta nos momentos de ócio. E quanto mais rápida a vida, menos desvios, menos dúvidas. Ela segue só em frente - há uma lei da física sobre isso. O problema é que também há um ditado:"depressa e bem não há quem".

Sunday, March 31, 2013

Missa das 19.04

O que é que define um local de oração, dei por mim a perguntar. Nunca gostei muito de igrejas. Lindas, oponentes, frescas, com cheiro a velho, cheiro medieval, cheiro de antepassados. Mas tão impessoais que nunca consegui que fosse ali o meu momento de catarse. De conciliação com as minhas crenças. Por ali estou eu, sentada ou mesmo de joelhos e aquelas caras sinistras olham para mim. E vejo as suas caras com expressão sofredora, misericordiosa, imutável. E nao percebo que conclusão tirar, quanto e como devo rezar, a que figura devo recorrer por nao ter conhecido pessoalmente nenhum deles. Talvez seja aquele espirito de união, de uma só reza que une tanta gente, que os faz acreditar mais veemente. E talvez aí mesmo resida o me problema com a igreja: nunca fui pessoa de seguir massas. Desconcentram-me, acabo por me esquecer do meu propósito, distraio-me. Observo-os e dou por mim a pensar porque nao sentirei eu o mesmo (será que afinal sinto?), onde se vai buscar tanta crença, que ensinamentos desperdicei eu - e com isto, já se me escapou 15 minutos de sermão e já não acompanho a história. Nao sinto a espiritualidade. Vejo-a, posso mesmo tocar-lhe mas a minha, essa não a sinto.

Hoje dei por mim a pôr uns auriculares, ligar a música, recostar-me no banco do comboio e acho que rezei - ou algo parecido. E ao que parece tenho-o feito em todas as viagens, agora que penso nisso. A solidão imensa que sinto, rodeada por estranhos, faz-me sentir especial. Como que numa banda-sonora. Também olho, também procuro olhar mas nao vejo figuras sinistras. Encontro-me no reflexo do vidro e acho que é isso mesmo - encontro-me. Sem máscaras, sem ter que falar. Fico ali calada, a olhar para um reflexo. O meu, mas de fora, aquele que percorre todos os quilómetros. Aquele que só surge quando o tempo pára e nao tem para onde ir. Aquele que fica uma hora e vinte e três minutos comigo. Aquele que é todas aquelas figuras com expressão imutável, aquele que reza sem se ajoelhar. E seja quem for a quem esse reflexo reze, espero que não se importe com o facto da minha espiritualidade se resumir ao comboio.

Saturday, February 09, 2013

Greve na CP

Fico na duvida se isto de viver é giro ou não. Dou por mim indecisa, sem saber se me hei-de chamar injustiçada ou felizarda. Sem saber o que achar deste conjunto de dias sucessivos.
Quer dizer, é que às vezes cansa!mas também que hipótese temos quando nos cansamos? Não seria giro se pudéssemos fazer um interregno? Uma pausa para pensar com clareza, redefinir estratégias.
É que às vezes o suspiro não chega para calar este turbilhão efervescente. Os pulmoes enchem mais, sim senhor, o diafragma desce mais, sim senhor, a musculatura relaxa, sim. Mas e depois? E os problemas, relaxam? Ar puro por acaso faz mais do que isso: purificar o ar?
É que às vezes dava jeito a vida dar um suspiro para aliviar tensões, distender prazos e realinhar segmentos.
Mas não! A única coisa parecida a isso é a noite. Mas e os sonhos? Esses selvagens, que não controlamos? Estamos nós entretidos a alternar entre sono REM e não REM, mas esses sacaninhas não dão descanso. E pronto, acordamos e assim de repente até parece que descansámos, mas é pura ilusão. Uma migalha ou outra das aventuras noturnas por que passámos de vez em quando vem-nos lembrar que isto de viver não é coisa para meninos. É um turno de 24 horas.
E sinceramente eu nunca fui apologista disso dos turnos contínuos, acho que não é saudável. Se não é para os médicos e enfermeiros, porque é que tem que ser para nós, humanidade em geral? Acho que chega a uma altura que se perde imaginação para viver, não há reuniões para brainstorming da vida e portanto é tudo muito no imediato (o que não seria mau penso eu, estivesse eu atenta aos sinais do universo não é?). A vida não reune connosco e com um psicólogo para nos dar noticias dificeis, chegam de rompante e pronto, lá temos nós que nos limitar a reagir.
A vida não vem defender os nossos direitos em instituições próprias para o efeito, reuniões multidisciplinares.
A vida é um patrão bi-polar.

E eu vou fazer como os maquinistas da CP.